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Maria Cutia celebra dez de teatro de rua
Trupe de Belo Horizonte, com trajetória marcada pela forte conexão com o público, se apresentará gratuitamente nos dias 13, 14 e 15 de outubro, na praça Duque de Caxias, no Santa Tereza; nova montagem, com direção de Gabriel Villela, está prevista para o
No livro A Alma Encantadora das Ruas, o escritor João do Rio, no mais alto de sua sensibilidade, discorre sobre a rua, expandindo seu raso significado no dicionário. "A rua é um fator da vida das cidades, a rua tem alma!", escreve ele. Mais de cem anos depois da publicação, o grupo belo-horizontino de teatro Maria Cutia conserva fresca a frase do jornalista carioca. Comemorando dez anos de estrada em 2016, a companhia tem uma relação existencial com a rua.
Criado em 2006, o objetivo do Maria Cutia sempre esteve em torno de levar o teatro a todos, sem distinção de classe, idade, credo ou conhecimento intelectual. Por isso, a rua sempre se mostrou como palco ideal para suas montagens. "A rua se traduz como lugar de encontro, a escolha dela para as representações das nossas peças sempre esteve muito clara, desde o início do grupo. É na rua que o teatro nasce, da forma mais popular possível, e onde inclui o maior número de pessoas", comenta Leonardo Rocha, ator e um dos fundadores do grupo.
Os dez anos de estrada, aliás, se sustentam pelo contínuo desejo do grupo de encontro com o público, com cidades e com culturas diferentes. É uma trajetória construída embasada na resistência de fazer teatro de rua. Para Leonardo, porém, o maior desafio está nas intempéries: quando chove não é possível se apresentar. "Já outras características típicas da rua como a falta de constante foco do público ou o barulho do trânsito são incorporadas à cena. Nós transformamos algo que seria problema em jogo e isso passa a fazer parte do espetáculo", analisa Leonardo.
Dez anos em quatro espetáculos gratuitos
Ao longo dos anos, o grupo Maria Cutia criou quatro espetáculos com uma linguagem universal para que o público das ruas, das praças e dos espaços públicos se sentisse parte das peças. Agora, em comemoração pela trajetória embasada na forte conexão com as pessoas, o Maria Cutia volta às ruas, mais especificamente na Praça Duque de Caxias, no Santa Tereza, com as montagens Na Roda (2006), Concerto em Ré (2010), Como a Gente Gosta (2011) e Ópera de Sabão (2015). As apresentações ocorrerão nos dias 13, 14 e 15 de outubro. Veja as sinopses no final do texto.
Abre a programação o espetáculo Concerto em Ré – um espetáculo de rock'n' roll e palhaçada, no dia 13 (quinta-feira), às 20 horas. A peça, segunda criação do grupo, surgiu a partir do aprofundamento dos estudos do universo da palhaçaria com o desejo de criar uma obra que trouxesse centralidade à figura do palhaço. O espetáculo é marcado pela criação de toda trilha sonora musical original, caminho que vem sendo percorrido até hoje na poética do grupo. "A vontade era de misturar a música nessa pesquisa que tínhamos desses palhaços criados a partir dos nossos ridículos e dos nossos desejos. Como pano de fundo, entrou o universo do rock e todas as possibilidades de chacotear grandes astros", comenta a atriz do grupo Mariana Arruda.
No dia 14 (sexta-feira), o Maria Cutia apresenta ao público sua mais nova montagem, o espetáculo Ópera de Sabão – um melodrama radiophônico, às 20 horas. Criada em 2015, a peça, com direção de Eduardo Moreira e texto de Raysner de Paula, é resultado de experimentos de cena da companhia e de estudos dos melodramas clássicos do circo teatro. Ela também flerta com a metalinguagem. "Este espetáculo passeia pela paródia e pelo melodrama clássico ao falar de uma rádio em decadência. Talvez esta seja uma obra que fala muito do teatro, dessa impressão que sempre temos de que ele está chegando ao fim, da decadência do ofício, muitas vezes sem público, tantas vezes sem dinheiro", analisa Mariana.
Para encerrar a programação, serão apresentados os dois outros espetáculos teatrais do Grupo no dia 15 de outubro (sábado). O primeiro, Na Roda – um espetáculo brincante, tem início às 11 horas. Montado em 2006, a peça, além de marcar o início da trupe, traduz bem o espírito do Maria Cutia que começou com um grupo de amigos que se aventurava em praças e parques para cantarolar em roda e brincar com o público. Para os atores brincantes do espetáculo, Mariana, Leonardo e Hugo e para a produtora e integrante do Maria Cutia Luisa Monteiro, é sempre um prazer apresentar o Na Roda, pois com ele puderam conhecer pessoas das mais diversas partes do mundo, desde distritos rurais do interior de Minas até países da África.
Um pouco mais tarde, às 17 horas, o grupo encena Como a Gente Gosta – uma comédia shakespeariana sobre o amor. A montagem é marcada pelo primeiro encontro com o diretor Eduardo Moreira, fundamental nas pesquisas de teatro do Maria Cutia. "Com ele, aprendemos a fazer estudo de mesa, a pensar personagens mais próximos de nós mesmos, a buscar o sentimento e o sentido, e não apenas o que funciona para fazer rir. Nos aprofundamos no amor e no quão ridículos são os apaixonados, pra constatar com estas palavras, mesmo 500 anos depois, como esse tal Shakespeare é contemporâneo", relembra Mariana.
Maria Cutia em números
Não é segredo para ninguém que para que algo dê certo, seja um projeto ou empreendimento, é preciso ter garra e determinação. Com o teatro, especialmente, não é diferente. Muitos grupos precisam batalhar todos os dias para manter seus espetáculos e suas contas em dia. Por isso, o reconhecimento do trabalho de quem lida com as artes cênicas diariamente é essencial, principalmente quando vem com bons números, como é o caso do grupo Maria Cutia.
Desde que colocou os pés na estrada, em 2006, o grupo já se apresentou em mais de 800 espetáculos, em 150 cidades de 19 estados e cinco países da África, Maputo (Moçambique), Luanda (Angola), Praia (Cabo Verde), Bissau (Guiné Bissau) e Ilha de São Tomé (São Tomé e Príncipe). Além disso, a trupe realizou mais de 100 oficinas artísticas e teve um público de mais de 300 mil pessoas.
No ano em que completam dez anos de estrada, mais um presente: o grupo já encenou suas montagens mais de 60 vezes em 27 cidades para um público de mais de 24 mil pessoas. Segundo o ator do grupo, Leonardo Rocha, os números foram alcançados graças à determinação do grupo em se manter na rua. "Conseguimos nos apresentar facilmente em locais que não têm casas de teatro. Nós, inclusive, damos preferência para lugares onde é mais difícil chegar o teatro, como cidades do interior do estado, do Norte de Minas, do Vale do Jequitinhonha, capitais e sertões da região Norte e Nordeste do país. Isso nos faz também conhecer partes do país bem preservados em suas raízes culturais", comenta Leonardo.
Nova montagem para o ano que vem
Com a bagagem de quatro espetáculos originais, a trupe caminha agora para a montagem de mais uma peça. O grupo vai trabalhar pela primeira vez com o diretor Gabriel Villela. "O Gabriel tem uma poética muito peculiar, sempre tivemos vontade de trabalhar com ele. O acabamento plástico em suas obras é qualificado pela mistura entre estilos e características culturais. O barraco mineiro com o elisabetano, os ponchos peruanos com o charro mexicano. Ele também tem uma relação muito forte com a música, assim como a gente. Depois de um tempo de namoro, finalmente esse casamento vai dar certo”, declara Leonardo.
Prevista para o segundo semestre de 2017, a montagem terá como base o texto Mistero Buffo, de Dario Fo. Nele, o escritor italiano aborda os mistérios da idade média que eram recontados pelos bufões. “Os evangelhos apócrifos, mais tarde renegados pela Igreja, eram espalhados pela tradição oral em feiras e praças. Os bufões relatavam a Ressurreição de Lázaro, por exemplo, como se eles estivessem lá presencialmente. Obviamente, subvertiam os fatos, contando-os sob outra perspectiva, satirizando-os. Se existem os ‘autos de moralidade’, podemos dizer que estes são ‘autos de imoralidade’”, ironiza Leonardo.
Calendário personalizado
E não é só a nova montagem que abre o ano que vem com novidades. O grupo se prepara para lançar o Clownlendário 2017, calendário idealizado e executado pelo grupo. Nas páginas do marcador de datas anual, o Maria Cutia, ali como os palhaços Felim, Tadeu e Begônia, reproduzirá capas de discos da MPB. Artistas como Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil, Chico Buarque, Elis Regina, Rita Lee e Cartola, emprestam suas capas para os palhaços as reinterpretarem.
Além disso, o Clownlendário – “clown” (palhaço, em inglês) – faz charadas e piadas com datas e feriados. “Cada mês também vem com pitadas textuais de risos. Só quem tem vai saber, por exemplo, se depois de 31 de agosto setembrochove?”, conta o ator e palhaço Hugo da Silva. O Clownlendário 2017 é a terceira edição do calendário. Em 2015, o tema foi cartazes de filmes musicais, e em 2014, de capas de discos de rock'n'roll.
As comemorações de dez anos de teatro do Grupo Maria Cutia são viabilizadas parcialmente pelo patrocínio da Petrobras pela Lei Estadual de Incentivo à Cultura de Minas Gerais.
Foto: Luisa Monteiro
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