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Casa de gafieira, clube de futebol, restaurante, bar da Lôra e companhia teatral, tudo isso já teve sede no número 3.613C da rua Pitangui, no Horto, região leste de Belo Horizonte, onde hoje funciona a Gruta. Desde 2011 sob o comando da Casa de Passagem, união dos artistas Admar Fernandes e Joyce Malta, o espaço de arte mantém as diferentes vocações do endereço, acolhendo desde shows, performances, espetáculos de teatro e dança até blocos de carnaval, ensaios de grupos artísticos, oficinas musicais e gravações de filmes. Para festejar esses quatro anos de intensa atividade, a casa preparou uma programação especial para agosto, com a participação de artistas e produtores que fazem parte dessa história.

 

A festa de aniversário, no dia 8 (sábado), reúne atrações que resumem a diversidade abarcada pela Gruta: a banda cearense Jonnata Doll e os Garotos Solventes, de volta à casa, e a belo-horizontinaFadarobocoptubarão; a estreia de Pílula Radioativa, série de intervenções do Virundangas, grupo que realiza seus encontros no espaço; e o projeto Obscenidades na Pista, que combina imagem ao som e teve sua primeira edição no local.

 

Formada em Fortaleza (CE) em 2009 e recém-radicada na capital paulista, a banda Jonnata Doll e os Garotos Solventes fará um show baseado em seu primeiro álbum, homônimo. Lançado em 2014, o disco tem produção do conterrâneo Yuri Kalil (Cidadão Instigado, Marcelo Jeneci e Thiago Pethit) e 12 faixas cuja musicalidade passeia por todo o movimento punk. As músicas versam sobre amor, drogas, loucura, violência e “a busca por algo incrível”, em letras declaradamente autobiográficas, segundo Jonnata Santos, o vocalista. Completam a atual formação o baixista Saulo Raphael, o baterista Marcelo DenisDead e os guitarristas Edson Van Gogh e Léo Breedlove.

 

Com uma apresentação marcada pelas danças do vocalista e uma aproximação estreita com o público, que chega a ter as guitarras em mãos, Jonnata Doll e os Garotos Solventes mostrou ter o espírito performático da Gruta nas duas passagens anteriores pelo espaço: em setembro, para a gravação de cenas de “A Cidade Onde Envelheço”, longa-metragem inédito de Marília Rocha, e em outubro, num pocket show. A banda já tem um segundo disco gravado, produzido por Alexandre Kassin, mas sem previsão de lançamento, enquanto o début ainda rende clipes, como o da música “Rua de Trás”, lançado neste mês. O vídeo tem direção do cineasta Dellani Lima.

 

A convite da banda cearense, o show de abertura será do Fadarobocoptubarão, quarteto de música instrumental pesada, nos moldes de estilos como metal, hardcore, grindcore, stoner e todo o barulho do underground. Sem cair nos estereótipos desses gêneros, no entanto, o Fada faz um som para o público “bater cabeça, mas também quebrar o quadril”. Criada em Belo Horizonte em 2008, com Chico (atualmente na guitarra), Porco (guitarra) e Batista (baixo), desde 2012 a banda conta também com Rodox (bateria). Tem dois trabalhos gravados, a demo “Força Dobberman” (2009) e o EP “Facul de Puta” (2011), e já tocou no festival Bananada, em Goiânia (GO), no Campeonato Mineiro de Surf e no Exhale the Sound, ambos na capital mineira.

 

A celebração de quatro anos da Gruta também marca a estreia de Pílula Radioativa. O novo trabalho do Virundangas foi criado no espaço, atual sede dos encontros do grupo, que conta com a participação de Admar Fernandes e Joyce Malta. Trata-se de números radiofônicos, audiovisuais, cênicos e dançantes de curta duração, apresentados como intervenções ao longo da noite. Reunidos sob o mote “alguma coisa na sua frequência sintoniza com a gente”, Canal Ecumenucu, Dicas de Moda e Suicídio com Brígida Voguel, Olimpiadas e Ovelha Psicodélica da Família Mineira são as doses de humor e crítica que compõem essa pílula, apresentada em pré-estreia durante a festa Negra Noite Obscena realizada em junho, também na casa.

 

Assim como os demais trabalhos do Virundangas, Pílula Radioativa é uma colagem de saberes distintos. A prática, que permite o acaso e ocupa espaços com o intuito de dialogar e produzir novas expressões e funcionalidades, é uma marca do grupo desde o início de suas pesquisas e já resultou em outros cinco espetáculos: "Três Irmãos" (2007), "Casa de Farinha" (2008), "Andarilhos" (2010), "Minotauro" (2012) e "Hoje é o Dia de Mais Ninguém" (2013).

 

Completa a programação da noite de aniversário o quarteto Obscenidades na Pista, cuja proposta é somar imagem ao som. A festa teve sua primeira edição na Gruta, em junho de 2012, e atualmente conta com discotecagem de DJota (Joyce Malta), Frida (Frederico Caiafa) e Shaitemi Muganga (Nina Caetano), sempre acompanhada pelas interferências visuais de Aindadá (Admar Fernandes).

 

Os integrantes do quarteto também fazem parte do Obscena, agrupamento dedicado à pesquisa cênica, que, assim como o Virundangas, realiza seus encontros e ações no local e redondezas. Nos últimos meses, os dois grupos compartilharam o espaço com as Bacurinhas. O coletivo realizou na Gruta os ensaios do espetáculo “Calor na Bacurinha”, que estreou no início de julho, e ainda promoveu festas na casa para financiar a montagem.

 

A festa continua

A programação de quatro anos da Gruta estende-se aos dois finais de semana seguintes. Em mais uma edição do evento Negra Noite Obscena, no dia 15 (sábado), o quarteto Obscenidades na Pista irá receber Zaika dos Santos, acompanhada do dj Edd. A cantora e compositora mineira apresentará as músicas de seu álbum de estreia, “Desabafo” (2011), e prévias do sucessor, "Akofena", como “As Negas”. Com produção do paulistano Wagner Bagão "Dubalizer", o single marca uma nova fase da artista, abusando de beats acelerados de música eletrônica, em sintonia com referências da ancestralidade - estilo que deve estar presente em todas as canções do disco, a ser lançado neste semestre.

 

 

Casa aberta

Com passagens por casas de shows como o lendário Circo Voador, no Rio de Janeiro (RJ), o Iconili, assim como Tiãoduá e Marcelo Veronez, é um exemplo de banda que adotou a Gruta em seu circuito. Integrante do grupo, a percussionista Nara Torres já ministrou oficinas musicais no espaço e, junto com o trompetista da banda,Victor Magalhães Silva, e o dj Luiz Valente, da gravadora Vinyl Land Records, encontrou no local, sempre aberto a projetos que misturem discotecagem a outras linguagens, o lugar ideal para lançar, em junho de 2013, a festaGeleia Geral Brasileira. A cada edição, o evento recebe um convidado, que pode ser tanto uma chef de cozinha quanto um pintor, para interagir com a seleção musical. Além disso, o público é estimulado a vestir trajes fora do comum, com direito a desconto na passagem – o ingresso para a Gruta.

 

Outra festa que a Gruta viu nascer foi a Dengue. Realizado desde dezembro de 2013, pelo coletivo This is noT, o evento tem como eixo o duelo de vogue, uma animada disputa desse estilo de dança inspirado em poses de modelos e popularizado em boates frequentadas por gays nos anos oitenta.

 

Sempre dispostos a acolher eventos e grupos, não é à toa que os artistas Admar Fernandes e Joyce Malta se apresentem como caseiros da Gruta. O nome, aliás, é anterior à chegada da Casa de Passagem ao endereço e foi mantido. Embora não se saiba ao certo sua origem, traduz a arquitetura do espaço, cuja entrada se dá por um longo corredor que lembra um beco e se abre para dois salões contíguos. A cada evento, o ambiente transforma-se sem perder suas características originais.

 

Assim como mantêm o nome do lugar, seus caseiros também fazem questão de preservar detalhes como o piso vermelhão, no salão da frente, e o de ardósia, no de trás. Já o mobiliário é composto por itens herdados de cenários de peças de teatro e rastros de outras ocupações do espaço, doações de coletivos e de projetos, como o vizinho Galpão Cine Horto. Entre eles, há um piano e até um trio de poltronas vermelhas do antigo cinema, também usado na intervenção "Promoção do dia: entre sem bater e suba na vida!", da Casa de Passagem. Grafites, lambe-lambes e objetos feitos por artistas e até pelo público completam a decoração, dando ao espaço cara de rua.

Foto: Divulgação