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"Berra" | Espetáculo discute o feminino no sertão roseano e na contemporaneidade, com direção de Marco Paulo Rolla

Com direção de Marco Paulo Rolla, o espetáculo evoca imagens do feminino que povoam a obra de Guimarães Rosa, com uma encenação que traz elementos da performance e das artes plásticas, e um discurso feminista que rompe com os padrões de comportamento impostos à mulher, trazendo como inspiração a liberdade, a força e a impetuosidade das jagunças do sertão brasileiro.

 

No dia 15 de junho (quarta-feira) estreia o espetáculo "Berra", com direção do artista plástico e performer Marco Paulo Rolla. A montagem, que traz no elenco as atrizes Elisa Santana, Antônia Claret e Ludmilla Ramalho, faz duas temporadas em Belo Horizonte.

 

A primeira, de 15 a 18 de junho, quarta a sábado, às 20h, fica em cartaz na Zap 18 (Rua João Donada, 18 - Serrano, tel.: 31 3475-6131), e a segunda, de 21 a 24 de junho, terça a quinta, às 20h, faz três apresentações no Espaço Candongas (Av. Cachoeirinha, 2.221 - Cachoeirinha. Tel.: 31 3444-1964). Em ambas os ingressos custam R$20 e 10 (meia), disponíveis nas bilheterias dos espaços. Duração: 60 minutos. Classificação indicativa: 16 anos. Gênero: Teatro Performativo.

 

Esse espetáculo tem o patrocínio do Uni-BH (Minas Gerais Educação S.), por meio dos benefícios da Lei Municipal de Incentivo à Cultura.

 

PROCESSO DE CRIAÇÃO

O projeto surgiu dentro da Zap 18, espaço onde as três atrizes, que integravam o elenco do espetáculo "Esta Noite Mãe Coragem" - direção da Cida Falabella -, se conheceram. Desse encontro artístico surgiu o desejo de investigar o universo feminino, partindo da figura masculina dos jagunços que viveram no sertão mineiro, no final do sec. XIX e princípio de XX, e da importância da presença feminina no contexto do Cangaço, que aconteceu nas décadas de 40 e 50, no nordeste brasileiro.

 

Na primeira fase de ensaios, as atrizes foram orientadas pelo diretor Carlos Rocha para a criação das personagens femininas, inspiradas nos jagunços do sertão de Minas. Num segundo momento do trabalho, veio o convite ao artista e performer Marco Paulo Rolla para assumir a direção do espetáculo.

 

Com o diretor Marco Paulo Rolla, a equipe também tomou como inspiração as condições e o papel da mulher dentro dos grupos de cangaço, prioritariamente masculinos, nômades e fora da lei. Esses bandos caracterizavam-se como uma das primeiras revoltas sociais populares. "A mulher que decidia por esse destino tinha em conta um certo ganho de liberdade. Mesmo que subjugada ao papel de esposa e propriedade dos homens do bando, era mais livre que as mulheres casadas de arranjos familiares", explica o diretor.

 

Esse foi o ponto de partida para direção e atrizes resgatarem sentimentos femininos básicos, em situação limite. "Apesar de sermos atrizes de gerações diferentes, o discurso que fomos construindo tinha em comum a emancipação feminina que, de alguma forma, já aparece historicamente no comportamento dessas mulheres  jagunças, que, naquela época, saiam de casa e iam contra a sociedade, muitas vezes fugidas, raptadas, ou por vontade própria, para viver com 'bandidos' sanguinários", explica a atriz Elisa Santana.

 

As mulheres tinham que ser levadas para longe do grupo para se proteger de ataques e viver à sua maneira, genuína e independente das  obrigações conjugais. "Talvez nestes momentos elas experimentassem a sensação de serem donas de sua própria vida e deterem que extrair força e determinação de situações extremas", constata Elisa.

 

Além das pesquisas históricas e da inspiração na literatura roseana, as atrizes foram provocadas pela direção para um mergulho pessoal, nos seus desejos e questionamentos como mulher hoje. "Voltamos às mulheres que somos nós e todas que existem por aí, e em tempos distintos. No meu trabalho, entra meu presente, meu futuro e a minha ancestralidade. Tenho comigo minha mãe, minha avó, minha filha. Sou a memória feminina do mundo", conta Elisa.

 

"Berra trata do feminino tentando se libertar dessa ideia do ideal de beleza e delicadeza, atribuído a nós, mulheres", explica Antonia Claret. "Seja no sertão ou numa grande metrópole, o  Berro é um basta, o que quero é ser vista como ser humano e tratada com dignidade!", acrescenta a atriz.

 

O feminino no agreste tem de se revirar e explorar o masculino e o feminino, ultrapassando o desenho social de gênero, além da compreensão desta força dentro de nós. "Menina, nasci já com sela nas costas. Identidade fabricada. Tudo para manter a ordem. Essa ordem não me interessa. Porque sou égua, sou cavalo, sou bode, que berra", explica a atriz Ludmilla Ramalho.

 

Como resultado da pesquisa, "Berra" traz para a cena três mulheres, três corpos vivendo em uma realidade sem poses e, por isso mesmo, com dignidade e liberdade de ser humano". "'Berra', portanto, é mais um grito que vem de dentro de corpos femininos que até hoje são subjugados a uma sociedade machista, onde a mulher vem a cada dia ganhando mais espaço, mas está longe de ser tratada como igual ou equivalente", conclui Marco PauloRolla.

 

LINGUAGEM

Neste trabalho, texto é imagem, portanto, os figurinos-escultura, concebidos também pelo artista plástico Marco Paulo Rolla, sintetizam no corpo a dureza e a aridez do sertão. O corpo das mulheres carrega a paisagem e a força do cerrado. As mulheres transitam entre o vegetal, o animal, o geográfico e o humano, evocando entidades do poder feminino. Carregando e deslocando sua bagagem de vida, as três personagens não são caracterizadas com vestimentas de uma época, mas com roupas e objetos que nos transferem para um ser amplificado em tudo, um ser que não se divide e está naquele estado e condição de existir.

Foto: Luiza Palhares

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