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Documentário aposta em metodologia colaborativa para construir um retrato dos 50 anos de um bloco carnavalesco

- lançamento: 25 de maio no Usiminas Belas Artes Cinema - São 50 anos ininterruptos de Carnaval. Mas a importância dessa manifestação popular não se mede somente durante os dias de folia. Os jovens da cidade de Prados-MG jamais poderiam imaginar que o dia 9 de janeiro de 1962, quando deram início à história do Bloco da UCA, seria um ponto de partida para profundas transformações sociais e culturais que a cidade iria vivenciar. As repercussões desta iniciativa, que se chocou com os valores e comportamentos padronizados da época e com o conservadorismo de uma poderosa Igreja Católica, são abordadas no documentário Pra fazer carnaval mais uma vez. O filme foi produzido e dirigido por Léo Rodrigues e integra um projeto de conclusão do curso de Comunicação Social da UFMG, aprovado com nota 96 pela banca avaliadora. A obra, que já foi apresentada na cidade de Prados, poderá agora ser apreciada em Belo Horizonte, nas telas do Usiminas Belas Artes Cinema (Rua Gonçalves Dias, 1581). A sessão acontece no dia 25 de maio, às 11h, com entrada franca. Carnaval de Prados O diretor optou por não utilizar narrador em off e todo o discurso é construído a partir da voz dos entrevistados. Para compreender melhor o Bloco da UCA, o documentário analisa também diversos acontecimentos que têm impacto decisivo na sua trajetória. Entre os principais, estão a criação dos blocos infantis e o surgimento do Gato Preto, cuja rivalidade com o Bloco da UCA é hoje o principal motor da manutenção do Carnaval. A façanha de Prados nos últimos 50 anos é única na região das vertentes mineiras. “Mesmo as vizinhas São João Del-Rei e Tiradentes, cidades de grande efervescência cultural, tiveram períodos de folias suspensas nas últimas décadas, seja por questões organizativas, ambientais ou de segurança pública”, conta Léo Rodrigues. Num contexto onde diversas cidades do interior mineiro se deixaram levar pelas tendências comerciais, Prados ainda aposta na tradição. “Podemos observar hoje que, em diversos lugares, os sons tradicionais do Carnaval foram substituídos pelos novos ritmos do axé e funk, que passam a dominar toda a cena. Prados não abre mão do samba, das bandinhas que tocam marchinhas e outros elementos que dão um sentido próprio à noção de modernização desta data nacional”, analisa o diretor. Conteúdo colaborativo A maior parte das filmagens foi realizada durante o período que compreende os preparativos e o Carnaval de 2012, quando o Bloco da UCA completou 50 anos. Paralelamente, a produção do documentário apostou também no levantamento e no estímulo ao conteúdo colaborativo. Incialmente, foi realizado um trabalho de divulgação para que a população se empenhasse em ajudar no levantamento de um rico acervo de fotos e documentos. Aos poucos, foram também sendo mapeados integrantes ou simpatizantes do Bloco da UCA com domínio de técnicas que poderiam enriquecer o produto final, tais como a produção de vinhetas de animação e a realização de um cuidadoso tratamento das fotos. “Essas intervenções de diversos elementos da sociedade pradense também passaram a construir o significado do filme”, justifica Léo Rodrigues. Houve ainda a criação do papel de “produtores informais”, pessoas que se interessaram em colaborar e trabalharam na mobilização de potenciais entrevistados, no garimpo de documentos e fotos, no agendamento de filmagens em determinadas locações e até na reunião de músicos para gravação da trilha sonora. A trilha sonora foi composta por velhas canções e por músicas produzidas especialmente para o Carnaval 2012, já que o Bloco da UCA completaria 50 anos. Um samba, porém, havia sido composto há anos e nunca havia sido gravado, o que aconteceu finalmente por estímulo da produção do documentário. A fundação da UCA No início da década de 60, diversos jovens de Prados passaram a estudar nas cidades maiores do estado, tais como São João del-Rei, Barbacena, Juiz de Fora, Lavras e Belo Horizonte. Nas escolas e universidades, tiveram contato com ideais que pautavam as transformações políticas e sociais da época. Ao se reencontrarem nas férias, eles decidiram fundar a UCA. Nesse período, já se observava no mundo o embrião dos movimentos que culminariam em enormes transformações sociais, políticas, culturais e econômicas, tendo como símbolo maior o Maio de 68 na França. No Brasil, embora esse processo tenha se misturado com a crítica ao golpe militar de 1964, ele também se vinculou à crítica dos comportamentos e das relações de autoridade: questionavam-se as relações Pais-Filhos, Homem-Mulher, EstadoCidadão, Igreja-Fiéis, etc. “Em Prados, coube a esse grupo de estudantes promover e divulgar essas mudanças comportamentais, que já florescia em cidades mais desenvolvidas”, ressalta o diretor. O peso da então moral católica recaía de forma mais intensa sobre os jovens, sobretudo mulheres. Os olhares de repressão a qualquer costume que saísse do habitual constrangiam os jovens a usar gravatas, enquanto as moças também tinham seu vestuário padrão e deviam manter um relacionamento distante com os rapazes. Foi então que o Bloco da UCA passou a ser o espaço para a contestação cultural. Samba e carnaval “Em sou o samba, sou natural daqui do Rio de Janeiro”. A frase é da música A voz do morro, escrita por Zé Kéti em 1955. Menos de dez anos depois, Vinícius de Moraes, um dos maiores nomes da história da música brasileira, discordava na letra de Samba da Benção: “Porque o samba nasceu lá na Bahia. E se hoje ele é branco na poesia, se hoje ele é branco na poesia, ele é negro demais no coração” A questão da origem do samba historicamente é centro de uma polêmica cultural e acadêmica. Porém, nos anos 70, sob a influência do modernista Mário de Andrade, uma produção ensaística tomava outra direção: o eixo central passa a ser a crítica das origens. O argumento central dessa nova produção ensaística é de que, desde as origens, o samba não se prende a padrões e esta riqueza é que deve ser fruto de investigação. Impulsionado pelo desenvolvimento radiofônico, o samba será levado para os mais variados cantos do país, abrindo terreno para um sem número de entrecruzamentos sonoros e culturais. A adoção do samba como carro-chefe do Bloco da UCA é uma influência do Carnaval carioca e da mídia radiofônica da época. Não havia naquele tempo uma ideia muito consolidada do que se fazia em outras localidades, como por exemplo na Bahia ou em Pernambuco, cujas manifestações culturais apresentavam uma outra vertente rítmica: o frevo, os batuques de origem africana, etc. O samba era, naquela altura, uma espécie de som oficial do Carnaval nacional. Ainda assim, a absorção do samba e do modelo carioca de Carnaval sofre as adaptações construídas a partir da cultura local. A trajetória dos blocos pradenses evidencia um processo duplo de absorção e negação do Sambódromo carioca. “Referência nacional, o Carnaval hipermediatizado do Rio de Janeiro hipnotiza pelas dezenas de câmeras, não perdoa o erro e a irreverência, exige uma perfeita disciplina e organização das escolas, e mobiliza o olhar de todos a partir da competição técnica que tem como ponto culminante a apuração das notas dos jurados, para o qual toda a atenção deve se deslocar”, analisa Léo Rodrigues. Sem arquibancadas, sem ingressos, sem regras, sem concurso. O desfile dos blocos no Carnaval pradense deixa um campo aberto para a interação com o público: no encontro com o espectador, os participantes das apresentações escutam sugestões, criam performances instantâneas, improvisam percursos. O espectador se torna parte ativa da manifestação.

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