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Mostra do Filme Livre apresenta os 10 filmes premiados da edição 2016, que serão exibidos entre os dias 25 de maio a 04 de junho no CCBB BH

Entre os filmes que receberam o Troféu Filme Livre, destaca-se a produção mineira Subsolos, de Simone Cortezão, que será exibida no dia da abertura do evento, 25 de maio, às 20h

Com expressiva diversidade de formatos, gêneros e temas, a 15a edição da Mostra do Filme Livre, que acontecerá entre os dias 25 de maio a 13 de junho no CCBB Belo Horizonte (Praça da Liberdade, 450, Funcionários), este ano apresentará 10 filmes premiados pela curadoria do evento, sendo dois longas, dois médias e seis curtas. Os realizadores contemplados foram convidados para receber o troféu Filme Livre após a exibição dos seus filmes na noite de abertura da edição 2016 da MFL no Rio de Janeiro, em 9 de março. “A MFL nasceu há 15 anos para dar espaço, voz e poder a esses filmes, buscando chamar a atenção para essas obras e seus realizadores, que geralmente fazem seus filmes sem nenhum tipo de verba e ou aporte de leis de incentivo”, complementa Guilherme Whitaker, diretor e um dos curadores da Mostra.

A abertura da edição 2016 da MFL será no dia 25 de maio, no Teatro II do CCBB BH, a partir das 14h, com os filmes Noite, Outra e VIIII L'ERMITE, de Rebecca Moure, que integram a programação da Cabine Livre (filmes exibidos em loop). Em seguida, às 16h, 18h e 20h haverá exibição de variados filmes, curtas e longas, culminando, às 20h, com os filmes da sessão Panorama Livre 1, composta por Je Proclame La Destruction, de Arthur Tuoto; o premiado na MFL este ano,Subsolos, de Simone Cortezão; e Auto Copa Park, de João Atala.

A sessão Curta Minas também será exibida no primeiro dia da Mostra, 25 de maio, às 18h, antes da sessão de abertura oficial, às 20h. Compõem a Curta Minas as produções locais Arrudas, de Sávio Leite; José Baleia, de Júlio Cruz; Max Uber, de André Amparo; e Marx Pode Sair, de Carol Caniato, Eduardo Malvacini e Otávio Campos. Além destes, entre os filmes mineiros que fazem parte da edição 2016 da MFL estão U: Réquiem para uma cidade em ruínas, de Pedro Veneroso (sessão seguida de debate com o diretor); Curta Memória, de Arthur Benfica Senra; Bucólica 3, de Joacélio Batista; Quintal, de André Novais Oliveira; e os curtas infantis da série Cabeça de Ovo, de Erick Rocco.

De acordo com o cineasta, professor e crítico de cinema brasileiro Marcelo Ikeda, a mostra nunca quis ser acadêmica nem popular e sempre evidenciou os cineastas brasileiros independentes das gerações passadas e atuais. “Vendo em retrospecto, tenho um certo orgulho dessa independência. Destacamos também grandes personalidades do cinema brasileiro porque somos herdeiros de um cinema de resistência: Tonacci e Rosemberg são os que hoje ressurgiram em visibilidade, mas também José Sette, Elyseu Viscontin, entre tantos outros. Sinto que o cinema independente brasileiro permanece com seus momento de muita pulsão”, enfatiza Ikeda.

Entre os filmes premiados, estão O Signo das Tetas, de Frederico Machado; A Seita, de André Antônio; Escape From My Eyes, de Felipe Bragança; O Rosto da Mulher Endividada, de Renato Sircilli e Rodrigo Batista; Subsolos, de Simone Cortezão;Carruagem Rajante, de Jorge Polo e Lívia de Paiva; Monstro, de Breno Batista; Outubro Acabou, de Antonio Karen Seabra, Karen Akerman e Miguel Seabra Lopes; Parque Soviético, de Karen Black; e Ruby, de Guilherme Soster, Jorge Loureiro e Luciano Scherer.

 

Sobre os filmes premiados na edição 2016 da MFL:

O Signo das Tetas é o segundo filme da trilogia dantesca, idealizada por Frederico Machado, baseada em livros e poesias de Nauro Machado, seu pai falecido recentemente. O primeiro, O Exercício do Caos, e o terceiro, ainda por vir, As Órbitas da Água, completam o tríptico cinematográfico. Para Ricardo Mansur, curador da MFL, “o Signo das Tetas é um filme radical. Um épico dividido em capítulos. Um homem, sem nome, estupefato e perplexo, vaga em busca de algo. Esse homem se confunde com a paisagem, com as situações e com a natureza que o cerca. Não se distingue o que é homem do que é paisagem. É como se o inconsciente da personagem vomitasse o mundo, num sonho desperto. Atormentado pela lembrança dos seios da mãe, viaja sem rumo e se encontra exatamente onde o seu pé se fixa. Entre citações poéticas, a jornada se estende entre um prostíbulo, a casa da mãe e o mundo. Repleto de poesia, o cinema de Frederico Machado faz jus à obra do pai, que também atua no filme incorporando um misterioso personagem místico em aconselhamento poético e enigmático ao anti-herói atormentado. A excepcional montagem não-linear, cheia de falsas continuidades, e o desenho de som onírico colaboram para criar uma atmosfera de realismo fantástico. Tudo isso permeado pela paisagem e personagens com a cara do interior do Maranhão. O Signo das Tetas, apesar de extremamente brasileiro, é cinema universal”, destaca Mansur, curador da Mostra.

Já A Seita, de André Antônio, ambientado em um futuro com estética retrô, se constrói sobre um movimento de resistência aos imperativos de uma sociedade que aboliu o sono da humanidade. Seu protagonista, imerso em lânguida melancolia, reflete uma elite consumista, entediada e esvaziada de interesses políticos. Com sua elegância afetada, ele perambula pela cidade resgatando memórias e se divertindo com vários homens, até se encontrar obcecado pelo grupo que tem o sonho de Recife nas mãos: uma misteriosa (e maravilhosa) seita que deseja restabelecer a importância que o sonho sempre teve na realidade humana. “É através do sonho que descobrimos nossos papéis como criadores de realidades, o que o preenche com um teor político revolucionário. André Antônio cria uma bela atmosfera onírica para tecer sua trama, filmando Recife como se fosse um sonho, com sua câmera a flanar pelos espaços, indiferente aos atores, além de uma direção de arte nostálgica, retrô. Um filme jovem, político e inquietante, representando o prolífero cinema recifense e seus laços com a produção queer”, revela Diego Franco, convidado este ano para integrar a equipe de curadoria da MFL.

“Um homem refugo dum país em conflito noutro cuja história é cartografada por guerras não mais-ou-menos mundiais que as do Agora. Ao transitar íntimo por construções de amor e não, LuzSonho&Distopia, mundo real barra transfigurações subjetivas da ‘realidade’, reminiscências presentes ou flashbacks - reflexo da mesma propulsão flagrante - constante na cinematografia de Felipe Bragança, o prenunciado colapso PoPulacional comum a projeções tão futuristas quanto escravas de seu tempo rema contracorrenteza feito corre pra morte, válvula de escape do olhar-sem-lugar nonde lacunas sugerem mais que qualquer estrutura ‘datadanarrativa’, caguejando ao pé do ouvido berlindadá, mas não sei se te decifro”, assim descreve Gabriel Sanna, cineasta e curador da MFL, o filme Escape From My Eyes.

Guilherme Withaker, diretor e curador da Mostra, ressalta que O Rosto da Mulher Endividada, de Renato Sircilli e Rodrigo Batista, é um daqueles filmes que jamais esqueceremos, pois nos tocam em questões mais profundas, não necessariamente sérias e/ou baseadas em fatos reais, mas marcantes. Filmes que ressignificam imagens de arquivos públicos ou pessoais, que trazem de volta à vida mundos já falecidos e que, de toda forma, ainda somos consequências. Como em 1985, em Brasília, quando a TV anunciava eufórica e ingenuamente a volta da democracia ao Brasil e o sonho de ser feliz neste lugar. Agora, 30 anos depois, a viagem segue na paixão do narrador pela mulher trabalhadora vencedora e independente, justamente as 10 mães dos que fizeram o filme possível. “Todas aqui são Helena Fracasso, a mãe, mulher de verdade, a poderosa vanguardista sem igual e também, por isso tudo, a desgracentana sina de representar a ordem e o progresso de ter marido, filhos, emprego com carteira assinada e dívidas que podem sujar seu nome de família. A voz do macho prossegue friamente mesclando todo sarcasmo de ser humano em cenas, texturas e sons que nos deslocam para imprevisíveis camadas, num espetacular filme livre de meia hora que voa retina adentro mostrando um pouco do karma de ser brasileiro, um filme inacreditável”, enfatiza Guilherme.

O premiado mineiro Subsolos, de Simone Cortezão, sintetiza um universo bem específico que a MFL resolveu contemplar este ano. “Se para abarcar todas as vozes de um crescente cinema de cartografias transitórias criamos a sessão Territórios, sentimos necessidade de ir além e premiar este trabalho que, em nossa visão, catalisa urgências comuns a todos os outros destacados neste nosso apêndice. Ele figura justo em nossa sessão de abertura, no dia 25 de maio, também para ressaltar a importância deste recorte em nossa programação. O filme parte da trajetória de uma mulher desalojada por uma grande mineradora e um operário que sonha a vida longe dali, onde 'é tudo buraco e pó'. A câmera transita por paisagens em processos intensos de alomorfia e os ressignifica de forma abrupta quando uma virada é sugerida: o minério agora flutua em um cargueiro rumo à China, e os túneis estreitos da mina e seu maquinário dão lugar a céu aberto e todo universo a ser percorrido”, explica Gabriel Sanna.

Em Carruagem Rajante, de Jorge Polo e Lívia Paiva, surge entre as pedras uma personagem que caminha para a tela, para o mar, em noite de lua cheia e paisagem desértica. Já no primeiro plano é notável que nas mãos de Lívia e Polo o cinema é usado como um instrumento de poesia. “Um espírito livre transforma o cinema em uma arma magnífica e perigosa, como disse Buñuel. Com referências que passam pelo fantástico mundo de Mèliés aos filmes de vampiro, Carruagem Rajante é um filme descolado dos padrões do cinema e questionador dos temas que levanta e espalha pelas suas lacunas, principalmente a respeito de como fazer cinema. Costurado por um estilo livre à sua expressão e envolvido em uma atmosfera de mistério, o filme se torna uma arma perigosa contra os desejos de uma indústria cinematográfica, morna e anestesiante. Um filme coeso na sua irregularidade embriagante, com a trilha sonora original intensificando sua atmosfera fantástica e uma maneira teatralizada de apresentar emoções que beira o cômico. Quase um sonho, transporta o espectador para um ambiente fantástico, instigante e barulhento. Um belo exemplo das palavras de Buñuel”, destaca Diego Franco.

Violento, íntimo e passional, Monstro, de Breno Batista, é composto por fotografias analógicas e filmes amadores acumulados ao longo de três anos de um relacionamento à distância. Entre prazer e enlouquecimento, o trabalho abandona a narrativa realista ou documental para se sustentar em uma ficcionalização delirante, com uma voz que segue friamente em off enquanto narra situações na fronteira entre sonho e pesadelo. “Um filme sobre o desejo: essa força que move todo o movimento que acontece na vida, entrelaçado a um forte medo de esquecer o corpo amado, refletido pelo registro fotográfico obsessivo transformado em gesto cinematográfico”, frisa Diego Franco.

A performance do menino Antonio Akerman Seabra (Tontom), com apenas quatro anos, é uma das coisas mais preciosas de se ver em Outubro Acabou, de Antonio Karen Seabra, Karen Akerman e Miguel Seabra Lopes. Além de diretores e montadores, os três assumem a função no filme e na vida real de mãe e pai do inventivo ator-mirim. “O filme me parece ser um dos mais criativos projetos contemplados pela Riofilme recentemente (o curta foi selecionado no edital de 2013). Nas artes e manhas do metacinema de Tontom, a cinefilia de Karen & Miguel são contagiantes. A forma que o menino absorve todas estas referências e as transfigura é de um entusiasmo raro de ver no cinema. Não se trata apenas de uma criança 'brincando' nos campos da arte cinematográfica, mas de uma narração sobre a trajetória das técnicas e estruturas possíveis de se fazer cinema, especialmente o cinema alternativo, percorrendo formatos marginais como o super-8, 16mm e enfim o vídeo digital. O processo de realização do filme de Tontom percorre muitos dos obstáculos e descobertas do cinema como linguagem e, também, como 'matéria e memória' (as citações a Godard e Eisenstein são explícitas). A necessidade de se expressar e a descoberta e percepção de Tontom da possibilidade do cinema como memória, e ao mesmo tempo como um desafio técnico e material a ser vencido, são parte deste tripé que sustenta a trama de Outubro Acabou, se é que podemos falar nestes termos. A sequência do menino gritando por diversas paisagens uma espécie de manha-manifesto: “quero fazer meu fillllmeeeeee!”, traduz com irreverência e brilho a façanha incomum realizada por este trio inesquecível”, salienta o curador Chico Serra.

Em Parque Soviético, de Karen Black, segundo Gabriel Sanna, há certa dicotomia maniqueísta bastante recorrente no cinema contemporâneo a partir da qual é cada vez mais óbvio classificar filmes nalgum lugar entre narrativos ou ensaísticos, politizados ou despojados, por vezes alienados, anti-industriais ou pelegos, feitos por utopia, diversão, dinheiro ou mesmo amor. “Talvez seja um sintoma de era, esta em que as posições se mostram cada vez mais radicais, guerra fria não declarada onde os deslimites da artevida se tornam inquestionáveis, assim como as panelas de aço inox que se batem às janelas em razão histérica na mesma intensidade com que cassetetes acariciam o lombo da última black block virgem do carnaval de primavera mi/careta carioca… Em meio a esse mar turbulento e lamacento (valeu Vale!) alguns trabalhos se ancoram feito ilhotas à deriva em busca (intencional(?)) por equilíbrio, ou ao menos por um olhar menos estereotipado acerca dos arquétipos que sem notar nos tornamos a cada dia, quando por exemplo escolhemos entre gasolina ou motricidade orgânica, flúor ou cúrcuma, boi ou soja, couve paraguaja ou power skunk geneticamente catalisado em amsterdanos. “Em meio a isso tudo uma breve imagem nunca me fugiu da retina e me mata de rir a cada vez que reassisto esse pequeno filme-pérola que agora temos a felicidade de abraçar: quando Melissa, anti-musa do cinema autoral brasileiro (e cada vez mais mundial), posa para um selfie ao pé de Stalin em Berlim - cidade que carrega em suas cicatrizes antigos sintomas de tal dualismo. Há nesta imagem uma síntese incrivelmente poética de todos esses conflitos recorrentes a que estamos expostos e que, para mim, parecem fazer cada vez menos sentido ou, se um dia já fomos todos marcos, vale pensar um trocadilho para com a antiga moeda alemã: somos todos euros? Todos afros? Todos índios? Todos black? Ao menos por 10 minutos, somos todos tudo ou nada”, questiona Sanna.

Ruby, de Guilherme Soster, Jorge Loureiro e Luciano Scherer, é um filme peculiar. A princípio revela uma personagem de comportamento estranho e hábitos não convencionais. O primeiro plano mostra um banheiro entupido de plantas e a personagem a se esgueirar por aquela floresta caseira até emergir numa banheira, também cheia de plantas. A estranheza ganha mais corpo quando Ruby (o protagonista) começa a falar de si. Diz que é pintor, olha para a câmera, mostra uma tela que está trabalhando e discorre sobre seus gostos. Sua fala é eivada de certo alheamento e sua expressão revela um ser delicado e atordoado. “Tudo parece ficção, apesar da forma documental em que o filme se apresenta. Ruby continua a falar sobre si. Revela pensamentos, apresenta um orquidário e mostra Júlia, sua planta favorita. A câmera segue Ruby a apresentar ovos de caracóis na praia, animais mortos, que ele enfeita, um piano desafinado que sua mãe tocava, fotos de parentes que ele mantém na parede da sua casa para que os espíritos fiquem em paz, diz ele. O filme segue, mas a atmosfera não permite que você chegue a conclusão se é uma encenação ou se Ruby é real. Mesmo que seja real, Ruby está encenando. Com uma câmera apontada, quem é capaz de não encenar? Ruby, por fim, expõe para a câmera um forte drama íntimo, sem avisos prévios, quase ao fim do filme. Agora tudo parece real. Apesar disso, ainda fica a pergunta: será que é real? Mas, de que importa saber? Real ou ficção, Ruby é um instigante personagem de um filme que leva o seu nome. Um filme, filme. Filme, filme mesmo!”, evidencia Ricardo Mansur.

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