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Teatro em Movimento, por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura, traz a BH espetáculo com Marco Nanini

Com texto inédito de Jô Bilac, “Beije Minha Lápide” recebeu as indicações dos mais importantes prêmios do teatro brasileiro.

O Teatro em Movimento recebe “Beije Minha Lápide”, espetáculo com Marco Nanini no papel principal, que conta a historia de Bala, ardoroso fã de Oscar Wilde que está preso por quebrar a barreira de vidro que isola o túmulo do escritor no célebre cemitério de Père Lachaise, em Paris. Nanini tinha um antigo desejo de trabalhar com a obra de Oscar Wilde (1854-1900), mas nunca elegeu – entre tantas pérolas – um texto do dramaturgo para levar ao palco. Tampouco cogitava fazer uma biografia teatral, mesmo com a rica e conturbada trajetória do irlandês - ele foi preso por sodomia e outros crimes sexuais, no auge de sua carreira, ao se recusar a aprisionar seus impulsos afetivos. O impasse de Nanini foi rompido com esse texto inédito de Jô Bilac, indicado aos prêmios APTR, Shell e Cesgranrio. Dirigida por Bel Garcia e produzida por Fernando Libonati (Pequena Central), a montagem tem duas apresentações na capital mineira, no Sesiminas, dias 18 e 19 de abril, sábado às 20h e domingo, às 19h.

 

Desde a estreia, em agosto de 2014, o espetáculo foi aclamado pela crítica e visto por cerca de 15 mil pessoas, com apresentações no Rio de Janeiro e São Paulo. Pela Associação dos Produtores de Teatro recebeu indicação ao prêmio nas categorias: produção, ator protagonista, texto, atriz coadjuvante (Carolina Pismel) e cenário (Daniela Thomas). Indicado ao primeiro Shell como melhor texto. E indicado ao prêmio Cesgranrio como melhor texto e cenografia.

 

Para a realização de suas atividades, em 2015, o projeto mantém a parceria de patrocínios com o Itaú, via Lei Federal de Incentivo à Cultura. 

 

“Beije Minha Lápide” 

 

Se o drama de Bala é fictício, a proteção da sepultura é real e foi colocada por conta de um curioso ritual que os fãs de Wilde faziam ao visitar o local, ao – como o título do espetáculo indica – beijar a tal lápide. “O texto tem muitas analogias com a vida e a obra de Wilde, com algumas citações mais explícitas e outras que se refletem nas falas e nas histórias das personagens. Quem não conhece Oscar Wilde vai entender perfeitamente e esperamos que saia querendo conhecê-lo mais”, explica Nanini, responsável por convidar Bel Garcia para a direção e o jovem elenco da Cia. Teatro Independente para dividir o palco.

 

Carolina Pismel, Júlia Marini e Paulo Verlings vem de montagens bem-sucedidas da jovem companhia, como ‘Cachorro!’, ‘Rebu’ e ‘Cucaracha’, todas com autoria de Jô Bilac. Já Bel Garcia, fundadora da Cia. dos Atores, esteve como atriz na montagem de ‘O Bem Amado’ protagonizada por Nanini em 2007 e, desde então, desenvolveu carreira de diretora que culminou na premiada ‘Conselho de Classe’, dirigida em parceria com Susana Ribeiro e também escrita por Bilac. Assim como nas montagens do grupo, elenco, direção e autor construíram juntos a dramaturgia em um processo colaborativo.

 

O processo e a equipe

“Desde o primeiro momento, discutimos muito o conceito geral, os diálogos e o desenvolvimento das cenas. Fiquei impressionado com a rapidez do Jô, que modificava cenas inteiras em um dia e entregou o texto final em menos de um mês”, lembra Nanini. “O interessante é que o texto traz uma visão brasileira, de um autor brasileiro, sobre a história e o mito. Tem uma Paris retratada que pode ser um reflexo do Rio de Janeiro também”, analisa Bel Garcia.

 

Nanini e Fernando Libonati convocaram o grupo depois de assistir com entusiasmo a todo o seu repertório, que ocupou o Galpão Gamboa – espaço mantido pela dupla na Zona Portuária do Rio – em diversas temporadas. A equipe de criação é formada ainda pelos antigos colaboradores Daniela Thomas (cenografia), Antônio Guedes (figurino) e Beto Bruel (iluminação), parceiros de Nanini e Libonati em montagens como “Pterodátilos” (2010). Rafael Rocha, do grupo Tono, assina a trilha e Julio Parente as projeções.

 

“O texto já tem uma imagem forte e asséptica, ao trazer o protagonista preso em uma cela de vidro. A partir disto, a iluminação, a música e as projeções ajudam a trazer uma ‘temperatura’ para a cena”, resume Bel. “O vidro ironiza de forma bem cruel esta sensação de confinamento, pela qual Wilde passou injustamente, ao ser condenado por sodomia”, assinala Nanini.

 

Nanini, Wilde e Bilac

Foi na prisão onde Wilde escreveu ‘De Profundis’, uma de suas obras mais importantes, espécie de carta de amor escrita diariamente durante os dois anos em que esteve encarcerado. O texto documenta a conturbada relação de amor e ódio que manteve com Lord Alfred Douglas. Em uma profunda autoanálise de consciência, Wilde tece reflexões e observa à distância a sua própria tragédia.

 

’De Profundis’ traz Wilde fora de sua vida de luxo e sucesso que tinha desde então e mostra como a prisão redimensionou as suas percepções sobre a vida e a morte’, conta Jô Bilac, que criou a peça inspirado pela força que o discurso do escritor ainda tem. Nanini concorda: ‘‘De Profundis’ é quase um milagre pela forma com que foi escrita. Não somente os temas de Wilde que são atualíssimos, mas também a sua escrita irônica e elegante’, afirma Nanini, cujo tempo livre tem sido dedicada à pesquisa e releitura de textos do irlandês.

 

Bilac, que diz ter criado Bala como diálogo de seu encontro com Wilde e Nanini, passa a integrar o extenso e variado currículo teatral de Marco Nanini.

 

Somente nas últimas duas décadas – sempre com Libonati na produção – o ator protagonizou clássicos de Molière, (‘O Burguês Ridículo’, 1996), Edward Albee (‘Quem Tem Medo de Virginia Woolf, 2000) e Arthur Miller (‘A Morte de Um Caixeiro Viajante’, 2003), além de espetáculos mais ligados ao experimentalismo (‘Um Circo de Rins e Fígados’, de Gerald Thomas, 2005, e ‘A Arte e a Maneira de Abordar Seu Chefe Para Pedir um Aumento’, texto de Georges Perec com direção de Guel Arraes, em 2012). 

 

Esta alta produtividade inclui ainda autores nacionais (Dias Gomes, em ‘O Bem Amado’, de 2007, e João Falcão, no monólogo ‘Uma Noite na Lua’, 1997) e um flerte com a dramaturgia do americano Nicky Silver em ‘Os Solitários’ (2002) e ‘Pterodátilos’ (2010), ambas com direção de Felipe Hirsch. Neste período, conquistou os Prêmios Shell, Sharp, Mambembe, Bravo, APTR, APCA, Qualidade Brasil, Quem, Contigo e Faz Diferença (O Globo).

 

O Texto

O túmulo do escritor irlandês Oscar Wilde, no cemitério Père Lachaise, em Paris, é vedado ao público para evitar a erosão provocada, maioritariamente, pelo batom das visitantes que têm o hábito de demonstrar a admiração pelo escritor beijando a pedra. Uma barreira de vidro impede agora que qualquer um se aproxime.  Bala, é um  escritor com 60 anos, ainda com prestígio, mas afastado do mundo artístico. Politicamente incorreto, Bala é grande admirador de Oscar Wilde. Considerando um completo absurdo, além de uma afronta a memória do seu ídolo,  Bala quebra ele mesmo a barreira de vidro. Bala é preso e considerado senil. Na cadeia, recebe a visita da jovem advogada Roberta que se diz enviada pelo Estado como advogada de defesa. Bala não aceita advogados, alegando sanidade  e reafirmando que faria tudo novamente, mas acaba se simpatizando por Roberta,  sem saber que a jovem advogada  foi contratada por Ingrid, filha de Bala, que não o vê  faz muito tempo. 

 

Ingrid é guia no cemitério Pere Lachaise, passa o dia entre as tumbas das maiores celebridades mundiais. Grande fã de Wilde, entende as razões do pai, mas não entende o fato dele não aceitar sua visita, nem ajuda. Ingrid é jovem e está em pleno momento de mudança, vê em Paris um reflexo de um sistema cada vez mais asséptico,  de um mundo virtual que está cada vez mais perdendo o tato. Ingrid recebe notícias do pai através de Roberta, que acaba revelando que Bala está escrevendo uma carta diretamente para ninguém mais que Oscar Wilde.  Roberta tenta entender as razões do seu cliente, travando embates ideológicos que no lugar de afastar, acaba aproximando cada vez mais os dois. 

 

Na cadeia,  Fabian, jovem carcereiro cuja a ingenuidade e gentileza encantam Bala, inicia uma amizade íntima com o preso, numa linha tênue  entre desejo e poder.  A narrativa avança pelos dias de Bala, preso em sua cela de vidro, isolado como o túmulo de Wilde, num fluxo obsessivo,  como Salomé, exigindo o beijo de João Batista.  

 

O texto tem o túmulo de  Oscar Wilde como ponto de partida,  em um paralelo Paris/Rio de Janeiro e com todas as grandes capitais, que em nome do seu cartão postal,  levantam diariamente barreiras visíveis e invisíveis, evitando qualquer espontaneidade afetiva que nos aproxime de uma organicidade harmoniosa, mas que estejam perfeito para uma foto, um selfie.

 

 

Foto: Divulgação 

 

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