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Teatro em movimento apresenta “Inutilezas”, espetáculo com textos de Manoel de Barros
O Teatro em Movimento - em sua XVI edição-, em uma Co-realização do Sesiminas, recebe em Belo Horizonte, a peça “Inutilezas”, que reúne poemas de diferentes momentos da obra de Manoel de Barros. Com roteiro de Bianca Ramoneda, que também atua ao lado de Gabriel Braga Nunes e Pepê Barcellos - músico que faz as intervenções musicais ao vivo - , montagem tem direção de Moacir Chaves e direção musical de Pedro Luís (do grupo Pedro Luís e a Parede). O espetáculo conta a possível história das memórias de um casal de irmãos que passou a infância num lugar chamado de “lacuna de gente”. Protegidos pelo abandono, fizeram da invenção suas ferramentas de pensar e brincar. E do que não serve para nada, sua matéria de poesia. A peça pode contar também a possível história de uma dupla de atores que se reúne para transformar poesia em teatro, num jogo de cena que aposta na força da palavra e no espírito lúdico. “Inutilezas” estreou em 2002, sendo remontada pela mesma equipe, em 2015, um ano após a morte do poeta. À primeira versão da peça recebeu a benção do poeta, que não só aprovou o projeto como adorou o espetáculo: “Não estou acreditando no que eu vi! Um teatro verdadeiro. Não é uma declamação de versos. Não é uma recitação de poesia. É uma representação da palavra. É a representação de um texto poético. Com os personagens vivos e as suas contradições. Achei um primor de teatro. Estou me sentindo quase Nelson Rodrigues. Só que não trágico, mas meio engraçado.”
As apresentações em Belo Horizonte ocorrem nos dias 11 e 12 de março, sábado às 21h e domingo, às 18h, no Teatro Sesiminas.
O Teatro em Movimento tem o patrocínio do Instituto Unimed BH, realizado via Lei Federal de Incentivo à Cultura. ““Inutilezas” é um espetáculo para a alma. O tempo passa sem você perceber, é uma delícia”, diz Tatyana Rubim, idealizadora e curadora do Teatro em Movimento”.
“Inutilezas” traz uma espécie de teia, de renda e propõe um diálogo construído com poemas publicados originalmente em livros distintos, com grandes intervalos de tempo entre eles. Nessa aproximação, as peças do quebra-cabeça, reordenadas, abrem novas possibilidades de leitura. A construção desse jogo, feito com o aval e a confiança do autor, seguiu critérios que respeitam o ofício de “artesanía” do poeta: “Jamais mexemos na estrutura das frases ou substituímos palavras. Trechos foram deslocados com a preocupação de não amputar o encadeamento. Assim montamos uma conversa da obra consigo mesma como um jogo narrativo”, explica a roteirista e atriz, Bianca Ramoneda.
“INUTILEZAS”
Uma curiosidade: a palavra ‘Inutilezas' foi uma criação de Bianca Ramoneda, roteirista da peça (e também jornalista da Globonews, atualmente apresentadora do programa “Ofício em Cena”). Em sua troca de correspondências com Manoel de Barros, este ficou tão encantado que pediu licença à atriz para se apropriar do termo, criando um poema inédito inspirado na palavra. O poeta chegou a usar o termo para definir o seu ofício, como mostram algumas entrevistas:
“Prefiro as coisas menores, as coisas sem nome. Sempre fui muito voltado para as coisas sem importância. Há pouco tempo, uma poeta do Rio disse- me: "Quando você escreve, você só se interessa pelas `inutilezas'." A palavra é dela, "inutilezas", e me pareceu muito boa. O livro que estou escrevendo tem o título provisório de Tratado Geral das Inutilezas.” (para o Estado de São Paulo).
“Não tenho explicações para os 96 (anos). Se a gente faz só o que gosta, ajuda. Mas isso é um privilégio. Só faço inutilezas.” (para o Jornal GGN).
AS INUTILEZAS DA VIDA
A peça é uma ode às coisas "não servem para nada”, supostamente inúteis no nosso cotidiano e que, ressignificadas, transformam-se em matéria- prima da poesia. Em beleza e alimento para o espírito. Essa “inutilidade” é também metáfora para falar do ofício do artista. Tanto o poeta quanto a peça propõem a inversão de uma chave: a de que tudo o que fazemos precisa ter um sentido utilitário. “Os poemas do Manoel são atemporais, universais e de qualidade inquestionáveis, capazes de renovar o sentido a cada leitura e criar novas conexões. Ou seja, ele é um clássico. (...) num mundo desesperançado como o nosso, pautado pela economia, pela política, pela ciência e pelo pragmatismo, acho que é nosso dever puxar para a arte o lugar do encontro onde podemos perceber a realidade de outra forma. Mais lúdica, mas nem por isso mais frouxa.”, acredita Bianca.
A MONTAGEM
O cenário de Fernando Mello da Costa é formado por duas poltronas e alguns objetos espalhados pela cena, constituindo a memorabilia dos personagens. Numa relação direta com o espectador, a montagem se concentra principalmente no que ouvimos: o texto de Manoel de Barros e as intervenções sonoras criadas por Pedro Luis e executadas ao vivo pelo músico Pepê Barcellos, pontuando os versos com música, sons que remetem à natureza ou comentários sonoros que destacam o humor e a poesia do texto.
“Manoel de Barros tem uma escrita inteligente, crítica e lúdica, ao mesmo tempo. É um prazer ouvir diariamente suas construções sonoras. (...) Temos, agora, basicamente, uma maior concentração na sonoridade do espetáculo. A relação com a plateia se modifica, também, já a partir da mudança de um espaço de arena para um frontal.”, explica o diretor, Moacir Chaves, experiente em levar à cena textos que não foram originalmente escritos para o teatro: “Fazer teatro é sempre muito difícil, seja encenando uma peça convencional, seja trabalhando com textos não originalmente escritos para a cena, como nesse caso; é uma aventura, na qual temos que nos jogarsem medo de errar, sem receitas pré- estabelecidas, com lucidez, prazer e força de trabalho.”
DEPOIS DE QUINZE ANOS
Para criar o roteiro, Bianca Ramoneda reuniu os textos do poeta sem alterar a estrutura da construção das frases e ideias - trabalho árduo feito por quem se dedica a viver de palavras, chamado pelo próprio Manoel de “artesanía”. E preservou o espírito da obra: “Foi engraçado porque à medida que eu ia lendo os livros eu ficava com a sensação de estar ouvindo uma conversa. Como se os diálogos existissem, só que estivessem espalhados, em vários livros diferentes. Só faltava agrupá-los. Fui lendo e marcando com inúmeros papeizinhos as páginas que endereçavam para outras páginas e assim sucessivamente. Como que em busca de montar as redes de conexões, a teia de sentidos. Acho que quando um autor, do porte do Manoel, constrói uma obra ele persegue imaginários, temas, memórias, construções narrativas, palavras. Ele escava. (...)Conseguiríamos trazer para o teatro, em voz alta, a força e a beleza do que está impresso em forma de literatura? Trabalhamos arduamente para fazer o desnecessário, como diria o poeta. E erguemos a peça.”
E com o mesmo cuidado, o trabalho é recriado 15 anos depois: “Existem muitas peças dentro de ‘Inutilezas’ e é por isso que estamos aqui, nos reencontrando. A mesma equipe de 15 anos atrás, com uma integrante a mais: a saudade do poeta, que faleceu no fim do ano passado. ‘Repetir, repetir, até ficar diferente’, Manoel ensinou. Ao repetir, percebemos que somos outros e nossa peça também. ‘Inutilezas’, hoje, conta a possível história do reencontro de artistas que um dia montaram uma peça e precisam testar seus deslimites por receio de amanhecerem normais.”, diz Bianca Ramoneda.
Ao que Gabriel Braga Nunes completa: “Manoel partiu, nós envelhecemos, mas os textos não. Revisitá-los agora é perceber diferente (..) Os filhos aí, a voz mais grossa, menos ilusão geral e o olhar mais lúcido... será?!”. (...) Além disso, a peça não tem personagens definidos, então pode ser feita por qualquer pessoa em qualquer momento. Manoel situa a gente. Tem que olhar de tempos em tempos pra não sair da rota. Me animou a idéia de revisitar o tema tanto tempo depois. Afinal, 15 anos é a idade em que se deve assumir as irresponsabilidades.”.
FICHA TÉCNICA
Texto: Manoel De Barros / Elenco: Bianca Ramoneda E Gabriel Braga Nunes / Direção: Moacir Chaves / Roteiro: Bianca Ramoneda / Direção De Produção: Jaqueline Roversi / Músico Convidado: Pepê Barcellos / Direção Musical: Pedro Luís / Cenário: Fernando Mello Da Costa / Iluminação: Aurelio De Simoni / Figurino: Bia Salgado/ Fotos: Wellington Dantas / Realização Em Belo Horizonte: Teatro Em Movimento, Via Lei Federal De Incentivo À Cultura / Co-Realização: Sesiminas / Produção Local: Rubim Produções
Foto: Marco Terra Novas
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